A morte não é o fim
Confunde-me que os familiares de idosos não lhes queiram falar sobre a morte, e, mesmo quando é o próprio a iniciar a conversa, logo mudam de assunto.
Em caso de evidências sobre o agravamento do estado de saúde, logo esses cuidadores próximos criam uma ‘protecção’ ou biombo, tentando esconder, desviando as atenções para assuntos mais ligeiros.
A morte é um facto natural, e que, quanto a mim, deve ser preparado, não com tristeza e desespero, mas com alegria e esperança. A fé na ressurreição é uma certeza que ajuda as pessoas religiosas nesta passagem.
Talvez seja bom que cada um de nós, ao desempenhar o papel de cuidador, perceba que há vários modos diferentes de morrer, e nenhum deles deve ser entendido como fatalidade:
- Morrer por Deus – os séculos XX e XXI, malgrado o progresso tecnológico que a sociedade global usufrui, mercê de fundamentalismos absurdos, tem assistido a um número incontável de atentados bárbaros, provocando milhares de mártires que são mortos por causa da sua fé. E o mais absurdo ainda é que são mortos em ‘nome de Deus’, como se Deus pudesse mandar matar em seu nome;
- Morrer para Deus – Ainda no nosso tempo, talvez por causa do progresso civilizacional fomentador de um consumismo desenfreado, aumenta o desejo de uma felicidade, infelizmente mal compreendida e que a torna efémera, por ser fortemente egocêntrica. Basta olhar as estatísticas de divórcios, drogados, libertinagens, etc. Foi considerado antiquado e pouco simpático propor aos jovens a auscultação da sua vocação religiosa e por isso, em nome da liberdade de costumes, se vê a diminuição de sacerdotes, religiosos, missionários, e mesmo de leigos comprometidos. No entanto, é do conhecimento geral que a entrega destas pessoas a viverem numa vida de consagração ao Senhor, em nada diminui o grau de satisfação, pelo contrário, o intensifica e amplia, por se tornar comunitário e não individual, aberto aos outros e não egoísta. Aqueles que morrem para Deus, mostram bem que têm mais vida para os que estão ao seu redor, seja pela oração, pelo testemunho, pela caridade;
- Morrer com Deus – Na entrega diária que cada um de nós, crentes, faz, ao tratar dos filhos, dos idosos, no modo como aceita o colega de trabalho, nas mortificações do dia-a-dia, todos os dias, na maneira sorridente como enfrenta as vicissitudes da vida e faz perceber a caridade como dom de Deus;
- Morrer em Deus – A morte não é um momento e não precisa ser sofrida ou solitária. Se nós, cuidadores, familiares, vizinhos, soubermos dar a mão (um toque que dá força), o ouvido (mesmo que oiçamos repetidamente a mesma coisa), a boca (não para calar e mudar de assunto, mas para dar notícias alegres, interessantes, e de ânimo), e o coração (para demonstramos que essa pessoa não está sozinha no seu calvário), ajudaremos certamente a ultrapassar algum momento de dor física ou de dúvidas existenciais sobre o sentido da sua vida. Estaremos a caminhar juntos, solidários e podemos ajudar na preparação, não de um fim, mas de uma passagem, de uma aceitação na vida para além da morte.
Da mesma forma como a semente se transforma em flor e depois em fruta que alimenta ou dá novas sementes, assim o bebé será criança, adolescente, adulto, idoso, sempre à espera da Vida eterna. É bom saber esperar, sem medo, no evoluir da nossa vida.
Hoje, dia da Ascensão do Senhor ao Céu, é um bom dia para podermos também pensar na nossa própria morte. Não tenhamos medo de meditar nesta realidade que é natural e que é certa. Pode e deve ser preparada de forma saudável, tanto a nível de saúde física como mental. Se Jesus, depois da Sua ressurreição, apareceu vivo, durante 40 dias e ensinou a respeito do Reino de Deus aos Apóstolos, a todos para serem Suas testemunhas prometeu a força do Espírito Santo (cf Act 1, 3-8). Esse Jesus que tinha dito a Marta: Eu sou a Ressurreição e a Vida; quem crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá; e todo aquele que vive e crê em Mim nunca morrerá (Jo 11, 25), também nos quer dar vida, se crermos nEle.