A Promessa e a Aliança
Os textos contendo as promessas de Deus a Abraão são quatro e vão-se completando de forma harmoniosa:
- Gn 12, 1-4 É a voz de um Deus diferente dos deuses locais pois não era figurado por qualquer estatueta mas tinha o poder de se fazer ouvir por Abrão, dizendo-se único, e desafiando-o a sair da sua terra e a ir para a terra que Ele lhe iria indicar. Farei de ti um grande povo, abençoar-te-ei, engrandecerei o teu nome e serás uma fonte de bênçãos…E todas as famílias da terra serão em ti abençoadas. (Gn12, 2. 3b). E ele foi, porque acreditou, levando seu sobrinho Lot;
- Gn 15, 1-21 Não temas, Abrão! Eu sou o teu escudo, a tua recompensa será muito grande. É sem dúvida uma promessa do Senhor mas que cria uma dúvida: Que me dareis, Senhor Deus? Vou-me sem filhos e o herdeiro da minha casa é Eliezer, de Damasco… (Gn 15, 1b- 2). É uma dúvida dolorosa na medida em que parece oca por não incluir uma descendência carnal, a única que queria ter. Mas logo de seguida vem esta confirmação: Não é ele que será o teu herdeiro, mas aquele que sairá das tuas entranhas. (Gn 15,4). Abrão confiou no Senhor, e o Senhor outorgou-lhe isso como mérito (Gn 15,6). Abrão já conhecia o Senhor e também ele tinha confiança, mas a idade era avançada e punha em dúvida o Como? E Deus quis selar um pacto com Abrão para confirmar a Sua promessa. O ritual implicava um sacrifício animal e tudo foi preparado. Abrão esperou! Ao pôr do sol, apoderou-se dele um sono profundo; ao mesmo tempo, sentiu-se apavorado e foi envolvido por densa treva (Gn 15, 12). O Livro esclarece que as aves de rapina desceram sobre as carnes mortas mas Abrão afugentou-as (Gn 15, 11) significando também que queria afugentar os maus pensamentos, como nós devemos estar sempre alerta para limpar as nossas tentações. Este sono profundo e esta treva em que se vê envolvido mostra-nos que não é com as nossas capacidades mas pela iniciativa singular de Deus que o fogo passou entre as metades dos animais, que passa constantemente nas nossas vidas e estas trevas que o envolvem não são diferentes da Paz que o Senhor infunde em nós, quando nas nossas crises não sabemos como dar respostas concretas. O Senhor selou a Aliança com Abrão: Dou esta terra à tua descendência desde o rio do Egipto, até ao grande rio, o Eufrates… (cf Gn 15, 18b – 21). Um descendente nasceu, não da esposa mas da escrava, não pelo dom subtil de Deus mas por um esforço de Abrão e de Sarai para resolver o problema. Não significa que fosse ilegal, para a época estava nos conformes e poder-se-ia dizer que estava cumprido o acordo, sendo dado como nome à criança Ismael, que significa Deus ouve;
- Gn 17, 1-8 Estabeleço uma aliança contigo e com a tua posteridade, de geração em geração; será uma aliança eterna, em virtude da qual Eu serei o teu Deus e da tua descendência. Dar-te-ei, a ti e à tua descendência depois de ti, o país em que resides como estrangeiro, toda a terra de Canaã, em possessão eterna, e serei o teu Deus. (Gn 17, 7-8). Esta promessa tem vários pontos muito importantes a focar:
- O primeiro é que dá-lhe um novo nome e Abrão passa a chamar-se Abraão, que significa pai de muitos povos. Esta alteração é uma confirmação das promessas anteriores mas um sinal de que muitos povos que têm Abraão como Pai adoram o único Deus, talvez com nomes diferentes, talvez de forma ligeira: Acredita-Me, mulher, vai chegar a hora em que nem neste monte, nem em Jerusalém, adorareis o Pai… Mas vai chegar a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores hão-de adorar o Pai em espírito e verdade, pois são esses adoradores que o Pai deseja (Cf Jo 4, 20 – 24). Esta citação é muito importante para mim pois faz-me ver como ‘irmãos’ os judeus, os muçulmanos, os ortodoxos ou os protestantes e tenho de confessar que por vezes a minha pouca fé dá menos mostras de amor a Deus do que a deles. Bem sei que Jesus também disse, num consolo aos apóstolos um pouco atónitos com a percepção de que Jesus os ia deixar Na casa de Meu Pai há muitas moradas. Se assim não fosse, ter-vo-lo-ia dito, pois vou preparar-vos um lugar (cf Jo 14, 1- 11). Eu espero ter entrada neste lugar preparado para mim com todo o amor e que por vezes, sinto não merecer, mas não posso afirmar que Jesus não arranje também lugar para outros, que talvez até nem O conheçam ou O desprezem, desde que de consciência limpa;
2.O segundo ponto é que a aliança não é só com Abraão mas com a tua posteridade, de geração em geração e então o compromisso no seu cumprimento de O ter como seu Deus, passa também a ser de nossa obrigação, daqueles que aceitam esta aliança. E nesse caso deverão todos assumir com respeito o sinal da circuncisão, não uma ablação carnal mas a que é do coração, segundo o espírito, não segundo a letra (cf Rom 2, 29). E, tal como muitos judeus disfarçaram a sua no tempo dos macabeus, também eu, como muitos outros cristãos, muitas vezes, sinto disfarçar a minha, mais não seja, alinhando com conversas estúpidas nos cafés e entre amigos, fingindo não ser religioso;
3.Mas também Sarai se passa a chamar Sara pois Abençoá-la-ei e dela dar-te-ei um filho (Gn 17, 15). Estamos agora perante o filho da promessa, Isaac a quem, ainda antes de ser concebido já tinha o selo da bênção. Embora também abençoe Ismael É com Isaac, porém, que Eu estabelecerei a Minha Aliança, Isaac que Sara te há-de dar nesta mesma época do próximo ano. (Gn 17, 21);
- Gn 18, 1- 15 Quanto a mim trata-se de outra versão da promessa anterior pois parece ser simultânea Passarei novamente por tua casa dentro de um ano e nesta mesma época; e Sara, tua mulher terá já um filho (Gn 18,10). Em todo o caso acho lindo este capítulo em que vemos Abraão a ‘negociar’ com Deus a Sua misericórdia para com Sodoma e Gomorra.
Como disse acima não quero distinguir as várias promessas porque as vejo como uma única que vai sendo complementada e confirmada. Que eu saiba, em cada dia, ouvir esta voz que me chama e a quer também confirmar comigo.